Em grego, idiótes quer dizer aquele que só vive a vida privada, que recusa a política. Embora atualmente a palavra não seja usada popularmente com esse significado, ela inspirou o livro do filósofo e professor da PUC/SP, Mário Sérgio Cortella, e Renato Janine Ribeiro: Política para não ser idiota.
“Se você não faz política, alguém decidirá por você”, afirma Cortella, que ressalta a importância da participação política em todas as esferas, seja no condomínio, no sindicato, na cidade, no país. Ficar neutro, em suas palavras, é estar do lado de quem tem mais força. “É o mesmo que ver um menino de 15 anos brigando com uma criança de 5. Se você não fizer nada, quem vai ganhar?”, compara.
O filósofo explica que a política está presente em todos os momentos. “Todo encontro meu com outra pessoa é um ato político. Afinal de contas se eu existisse sozinho no mundo e no universo, não existiria política, porque não haveria a ideia de comunidade. Mas se eu vivo com outras pessoas, sejam duas, dez, um milhão, 30 milhões, 500 milhões, eu estou tendo em qualquer relação, algo ligado à ideia de poder, de convivência, de relacionamento, e nesta hora a política está vindo à tona”, diz.
Mas o brasileiro, segundo o filósofo, não tem tradição de participar, o que é fruto de 511 anos de exclusão. “A independência não foi um objeto de luta política, assim como a proclamação da República não teve grande participação popular”, destaca. Já a nossa democracia, com 25 anos de história, para ele, é ainda jovem. “O número de vezes em que a população entrou no circuito de participação ativa não foi tão grande dentro da nossa trajetória.” Cortella alerta que essa despolitização é absolutamente política: “Há um enfraquecimento da participação, como se política fosse uma coisa ligada a partidos.”
Educar, um ato político
A baixa escolarização interfere na ausência do conhecimento por parte dos brasileiros do que é política. Todas essas questões foram debatidas no dia em que a morte de Paulo Freire completava 14 anos, 2 de maio. Cortella falou a um auditório cheio de metalúrgicos de Osasco. O sindicato da região lançou um programa de educação sindical, que contou com a palestra de Cortella, onde ele reforçou qual deve ser a função da educação: emancipar.
Para o filósofo, é hora de pensar uma educação para evitar que mais pessoas sejam vitimadas: “Hoje se fala muito em excluídos, é muito leve, o certo seria dizer as vítimas da economia”. Ele fez críticas sobre a existência de analfabetismo de adultos no país, que em sua opinião é um problema de Estado. “Cuidado, isso não tem a ver só com governo, às vezes há alguém quem não sabe ler na sua casa, uma empregada, um jardineiro”, dispara.
Além disso, Cortella criticou a educação do estado de São Paulo. “É quase vergonhoso que o maior estado da federação, do ponto de vista econômico, tenha índices tão precários, no campo da educação pública.”
Questionado sobre o fato de alunos do 9º ano não saberem ler e não serem reprovados, Cortella explica: “O atrelamento da promoção automática, que é um sistema de avaliação, com a progressão continuada, que é uma organização do currículo, trouxe uma série de distúrbios. Não se pode implantar a aprovação ou promoção automática sem uma série de medidas laterais, que protejam a qualidade do que está sendo ensinado e as etapas de recuperação do aluno. É preciso melhorar as condições de trabalho, organizar período integral de atendimento, que haja um trabalho também com os pais e as famílias. E em São Paulo, no ponto de partida embora a ideia fosse boa, ela foi colocada de uma forma apressada e sem criar condições para se dar o suporte.”
Segundo Cortella, os índices só não são mais negativos, por conta da pressão do sindicato da categoria, Apeoesp. “O sindicato luta bravamente para que não haja uma depravação completa dessa estrutura”, afirma. Voltando à etimologia, ele explicou que sindicato vem do grego: syn e diké, junto e justiça. “É a ideia de alguém que se junta a outros para reivindicar a justiça para todos.”
Revista Fórum
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